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Johnny Vai à Guerra (Dalton Trumbo, 1971)



O que passa por sua cabeça quando você ouve ou lê a palavra “guerra” em algum lugar? Possivelmente, algumas imagens de filmes hollywoodianos, com milhares de soldados indo para o campo de batalha. Ou nomes de algumas figuras historicamente marcantes. Você já deve ter visto tudo sobre as guerras passadas, e está cansado de lembrá-las. Mas nem tudo é lembrado. Muitas guerras são esquecidas. E essa guerra sobre a qual escrevo você ainda não viu. Essa é a guerra, meu amigo, é a guerra do Johnny.

Você acorda. Está tudo escuro, e por mais que você force seus olhos, eles não respondem. É como se eles não estivessem lá, pois você nada enxerga. O que fazer? Entrar em pânico? Não. O pânico não seria de grande ajuda. Você pode tentar ouvir alguma coisa, afinal de contas quando você é privado de sua visão, sua audição funciona melhor. Mas o silêncio é tão grande que chega a ser ensurdecedor. Não há nada para ouvir. O jeito é gritar e esperar uma resposta de alguém. “Tem alguém aí? Onde estou?” Você ouve sua voz, mas percebe que o som não vem de suas cordas vocais. A voz que você ouve é a voz dos seus pensamentos, e infelizmente ninguém mais pode ouvi-la. Você, então, continua respirando. Pelo menos isso você consegue fazer, pois sente seu peito subir e descer com o ar que entra e sai dos pulmões. Você inspira... Pelo nariz? Onde está o seu nariz? Já chega! Você precisa se levantar! É hora de mexer os braços e as pernas! E aí... Que diabo aconteceu?


Você, meu caro leitor, deve estar se perguntando o que aconteceu com o Johnny. Como ele foi parar em uma situação tão dramática? Bem, a resposta é bem simples: Johnny foi à guerra. E sua história começa no momento em que sua vida termina.

Durante a Primeira Guerra Mundial, o governo americano convoca mais soldados para se juntarem à batalha. Aqueles que se alistaram voluntariamente são logo levados. Johnny (Timothy Bottoms) era um deles, e foi cumprir seu dever, o dever de um jovem que ama sua nação (?). Mas no último dia da guerra Johnny é atingido por um morteiro, e a explosão causa danos irreparáveis a seus braços, suas pernas e seu rosto. Os médicos não têm alternativa a não ser amputar seus membros, sentenciando-o a uma vida vegetativa sobre uma maca. Pelo menos ele vai poder ficar sob os cuidados de sua família, certo? Errado.

O fato de Johnny ter sobrevivido à explosão intriga os médicos... Perdão, a palavra mais precisa seria “pesquisadores”. Para eles, Johnny é um banquete, e eles decidem mantê-lo sob seus “cuidados”. Objetivo? Bem, é uma situação atípica, concorda? O morteiro deveria ter acabado de vez com sua vida, mas por algum motivo ele sobreviveu. Situações atípicas como esta são ótimos objetos de pesquisa (se você discorda você é atípico, e um dia alguém irá fazer uma pesquisa sobre você). Os pesquisadores acreditam que podem aprender muito com a situação de Johnny. Mas qual é o verdadeiro estado clínico deste soldado caído?

Será que é realmente possível saber sua real condição quando você não pode falar, nem mover seus braços, nem mesmo mostrar um breve movimento com os olhos... Espere! Lembre-se que você ainda pode tentar mover uma parte do seu corpo. Seu rosto foi danificado, mas você ainda pode mover sua cabeça e seu pescoço. Essa é a saída! Finalmente você vai poder mostrar a todos que tem alguém dentro desse corpo. É difícil, e você sabe disso. O esforço que você tem de fazer é muito grande, mas não lhe resta outra opção. Você está deitado, é fácil dizer, pois o sentido do tato não foi danificado. Ao girar sua cabeça para a direita, você sente sua orelha direita sendo pressionada contra o leito. Tem a mesma sensação quando faz o movimento para o lado oposto. Ótimo, você sabe que vai funcionar. Há alguém de pé ao seu lado. Como você sabe disso? É possível sentir as vibrações dos passos, que sobem pelas pernas do leito até atingirem seu corpo. Aproveite a chance! Tem alguém perto de você! Continue movendo sua cabeça de um lado para o outro. Sentiu isso? Sentiu uma mão em sua testa? Eles viram seus movimentos, e estão tentando se comunicar... Não! Por quê? Por que eles querem impedir seus movimentos?


O estado clínico de Johnny não é nada favorável (a ele). Os pesquisadores identificam danos irreparáveis ao cérebro, e interpretam qualquer movimento corporal como espasmo muscular. E ao tentar travar essa guerra, ao tentar se comunicar, Johnny terá de lutar contra essa interpretação. Para aqueles que estão ao seu redor, ele não passa de um pedaço de carne pulsante, mas que ainda tem algum valor para a ciência.

E você, meu caro, o que faria se estivesse no lugar desse soldado? Será que buscaria refúgio em algum lugar na sua mente? Seria melhor se perder no meio de suas memórias, ou se aventurar em um novo mundo de sonhos, buscando respostas para sua realidade? Acho que cabe a Johnny responder tal questionamento com precisão. Ele conhece a guerra, você não. Mais do que isso, ele conhece o lado da guerra que normalmente não é mostrado. E pensar que ele decidiu participar dessa guerra pela democracia... Como assim? Guerra e democracia? Guerras são democráticas? Claro que são. Se você considerar que, para alguns países, democracia é sinônimo de jovens matando uns aos outros, verá que a guerra é democrática. E isso você não aprende na escola. Isso você aprende com Dalton Trumbo.

Ao assistir a esta agonizante história, você terá outra perspectiva sobre guerras, conflitos e qualquer outro tipo de embate. Um exemplo clássico de repercussão de uma guerra faz-se bem presente em filmes americanos. Sabe aquele momento em que você ouve uma personagem dizer “meu pai é um veterano de guerra”? Isso é sempre dito com todo o fervor e orgulho. Claro, para eles é um motivo de glória. Bem...

Johnny Vai à Guerra e aprende que não há nada de glorioso nela. Ele não conheceu tal glória, se é que ela existe. Teria ele conhecido a glória se tivesse escolhido ficar? Se tivesse escolhido passar o resto de seus dias com sua amada, para formar uma família, e poder pescar como seu pai sempre fazia? Mas era possível fazer tal escolha? Na guerra, ele conheceu a dor, o sofrimento e o desamparo. Platão diria que Johnny conheceu a guerra como ela realmente é. O que você dirá?

Dalton Trumbo escreveu o livro Johnny Vai à Guerra em 1939, e pôde roteirizar e dirigir a adaptação cinematográfica em 1971. O filme, apesar de todo seu sucesso, só tornou-se mundialmente conhecido em 1989 (você já deve ter visto algumas cenas dessa obra-prima nesse vídeo). Desde então, tem sido considerado o melhor filme anti-guerra de todos os tempos. Caso você questione tal legado, sinta-se à vontade para acompanhar a saga de Johnny, e busque outro julgamento. Mas uma coisa eu posso garantir: esse filme não é para todos.

Infelizmente, o esforço parece ser em vão. Você tenta se comunicar, mas eles não te entendem. Ou será que não querem entender? O que te deprime mais ainda é que você nem mesmo se recorda se a guerra chegou ao fim. Mas uma coisa é certa: você a conheceu como ninguém mais.


“Só os mortos conhecem o fim da guerra.”
- Platão

Sinopse
Joe, um jovem soldado americano, é atingido por um morteiro no último dia da Primeira Guerra Mundial. Ele repousa em uma cama de hospital em uma situação pior que a morte - ele teve seus braços e pernas amputados, ficou cego, não tem mais boca nem nariz. Apesar de tudo, ele continua consciente, mas não consegue parar de sonhar e rever suas memórias, sem conseguir identificar se está dormindo ou está acordado. Frustrado com sua situação, ele tenta exaustivamente se comunicar com a equipe do hospital.

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