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The Walking Dead: A Decade of Dead (Skybound, 2013)



A série em quadrinhos The Walking Dead acaba de completar uma década de existência, e para coroar essa significativa conquista, a Skybound, que é hoje o lar de Robert Kirkman, em parceria com a Hyundai, Future US e Initiative, fizeram esse belo documentário detalhando a saga de um dos quadrinhos mais aclamados de todos os tempos. Entrevistas com o próprio criador e demais artistas envolvidos nesse projeto vencedor de vários prêmios, incluindo o Eisner de Melhor Série em 2010.

Mas o que torna essa HQ tão marcante? Bem, é claro que você vai chegar a diversas conclusões ao assistir o documentário The Walking Dead: A Decade of Dead, mas nós podemos conversar um pouco antes disso, não podemos?

Como você aprendeu com o texto do nosso mestre Victor, o que hoje nós vemos em The Walking Dead é reflexo da idealização do cineasta George Romero. Se nesse momento você estiver à procura de mais informações sobre ele na internet, cuidado com alguns textos por aí, pois dizer que ele é um mero “criador de filmes zumbis” está muito aquém de sua contribuição cultural.

Quando Romero lançou o filme Night of the Living Dead, em 1968, ele apresentou ao mundo uma nova concepção de mortos-vivos, e o subgênero chamado Apocalipse Zumbi. Subgênero porque está dentro da literatura apocalíptica, onde a “praga” que massivamente ataca a humanidade não poderia ter sido prevista.

A maneira como os acontecimentos se desenrolam a partir do surgimento dos zumbis segue algumas etapas. O filme Guerra Mundial Z, lançado em junho desse ano e dirigido por Marc Foster, é uma ótima ilustração dos eventos que se seguem. Se você assistiu, sabe qual é o primeiro estágio: pânico. Pânico geral se instala desenfreadamente e as pessoas, cada uma à sua maneira, imploram por salvação. Algumas rezam à Autoridade Divina, mas convenhamos que as ações que seguem vêm de outra autoridade: os nerds o governo. A resposta do governo e militares ao surgimento da “novidade” é o que marca a segunda etapa, e o resultado dessa ação imediata possibilita o surgimento de duas terceiras etapas.

Se a ameaça for contida, fim de papo. É claro que será necessário algum tempo para reconstruir o que foi destruído, para que as pessoas se restabeleçam socialmente e se curem do trauma psicológico (ou físico) vindo da repentina aparição de uma praga de proporções épicas. Mas, e se a ameaça não for contida? E se a resposta do governo não for o suficiente para impedir que ela se alastre? Se isso acontecer, nós temos o outro lado da moeda, o universo que é bem mais legal. E é aí que entra a genialidade de Robert Kirkman.

Se você acompanha a série desde o início sabe que Kirkman decidiu pular as duas primeiras etapas. Elas são óbvias e, para o propósito de The Walking Dead, desnecessárias. O que diferencia a séria de outras obras é justamente o foco dos acontecimentos. Aqui não há a necessidade de se saber de onde e como os zumbis surgiram, e esse elemento pode ser considerado um divisor de águas. Se você é um daqueles que precisa saber dessas informações imediatamente, nem comece a ler a série. Alugue os filmes da franquia Resident Evil e mor... "Seja feliz!"

The Walking Dead está aí há dez anos por conta desse aspecto. E, sinceramente, espero que permaneça assim. O que aconteceria se na edição de número 120 da HQ Robert Kirkman revelasse de onde o vírus surgiu? A série chegaria ao fim em pouco tempo. Por quê? Ora, porque é o caminho natural dos acontecimentos. Descobrir a origem de um problema é o primeiro passo para resolvê-lo. Mas, felizmente, esse não é o foco do criador.

O que Robert Kirkman quer nos mostrar, seguindo os passos de Romero, é justamente a resposta da humanidade ao ocorrido, trabalhando os questionamentos que enfrentamos quando nos deparamos com o caos. Como nós lidaríamos com toda a situação se as ações iniciais das autoridades falhassem? Como as pessoas se comportariam umas com as outras? Será que nesse universo hipotético ainda há lugar para íntegros, ou o que conhecemos como integridade dá lugar ao nosso distorcido instinto de sobrevivência? Nesse mundo, onde a grande massa está abalada psicologicamente e um simples estalar de dedos pode quebrar todos os códigos morais, a democracia é a melhor escolha?

Se “a ordem vem do caos”, The Walking Dead nos mostra que ela demora, e muito, a ser estabelecida. Se um dia a série terminar, provavelmente nós não saberemos se a ordem foi restabelecida ou não. Não acredito que, no fim das contas, teremos explicações sobre a futura erradicação da praga. Por quê? Porque The Walkind Dead não é sobre zumbis. The Walking Dead é sobre pessoas.

E qual é o papel da série de TV nisso tudo? Acredito que seja mais um indicador do poder da HQ. Nem sempre as produtoras estão dispostas a apostar em uma adaptação para o cinema ou televisão, com receio de dar um tiro no pé. Mas a AMC acertou em cheio, e os picos de audiência são cada vez maiores com o lançamento de novos episódios. Não vou falar sobre as diferenças entre os roteiros e personagens, até porque essa comparação é um pouco injusta. Apesar de dependerem bastante da imagem, quadrinhos e televisão são mídias muito diferentes e mudanças acabam sendo necessárias. O público é diferente: o que funciona para os leitores pode não funcionar para os telespectadores. Mas uma coisa eu posso afirmar: se você conheceu The Walking Dead através da séria da AMC, dê uma chance à HQ. Garanto que você irá se surpreender ainda mais.

Robert Kirkman pegou o que ele achava de mais interessante no universo criado por George Romero e criou uma obra de arte. Será que ele imaginava que um dia alcançaria tanto sucesso? É muito legal ver que as resposta dos leitores foi bastante positiva, e todo o apoio dos fãs ao trabalho de Kirkman contribui para a longevidade da série. Isso fica bem claro, tanto pelas palavras do próprio criador, como pela notável presença dos fãs em eventos. E se você perguntar ao Sr. Kirkman o que ele espera daqui em diante, sua resposta será simples e genuína: “Que venham os próximos dez anos!”

Seja pela HQ, seja pela série ou pelos games e brinquedos, faça parte desse universo e descubra o que há por traz dessa década de sucesso da franquia The Walking Dead.


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